Por Ademar Lopes Junior

O “Trabalho Escravo Contemporâneo” foi tema do Simpósio promovido pela Escola Judicial (Ejud) do TRT-15 nesta sexta-feira, 11/10, no auditório do Plenário Ministro Coqueijo Costa, no edifício-sede da Corte, em Campinas. O desembargador Eduardo Benedito de Oliveira Zanella, presidente do Comitê Regional de Erradicação do Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Discriminação da 15ª, conduziu a cerimônia de abertura, que contou também com a presença dos desembargadores Carlos Alberto Bosco, vice-diretor da Ejud, e Lorival Ferreira dos Santos, presidente da Corte no biênio 2014/2016 e representando, no ato, a Presidência da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB).

Ainda na Mesa Alta, tomaram assento o vereador Carlão do PT, presidente da Comissão Permanente de Direitos Humanos da Câmara Municipal de Campinas, e representando no ato a Presidência do Poder Legislativo local; o juiz Leonardo Wandeli, representando a Presidência do TRT-9 (PR); o juiz César Reinaldo Offa Basile, presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 15ª Região (Amatra XV); o juiz Farley Roberto Ferreira, presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região (Amatra II) e representando no ato a Associação Nacional da Magistratura Trabalhista (Anamatra); Sandro Rogério Batista Lopes, vice-presidente da Comissão Especial de Relacionamento da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo com o TRT-15, representando no ato o presidente daquela seccional, Caio Augusto Silva dos Santos; e Ademir José da Silva, representante da Subsecção Campinas da OAB.

O desembargador Eduardo Zanella ressaltou a importância do evento, especialmente nos tempos atuais em que ainda se registram inúmeros casos de discriminação racial e de tráfico de pessoas. O magistrado salientou também o exemplo do TRT-15 no combate a essa “chaga social”, com a criação, em 2014, do Comitê Regional de Erradicação do Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Discriminação, com o objetivo principal de elaborar estudos e apresentar propostas e ações para sensibilizar a sociedade.

O vice-diretor da Ejud, desembargador Carlos Alberto Bosco, destacou a “extrema importância do evento”, mas lembrou que “não basta identificar o problema, é preciso combatê-lo”.

Arte inspiradora

Antes do início do ciclo de palestras, a servidora e cantora Claudia Elis Pereira Araújo se apresentou num trio formado também pelos músicos convidados Guilherme Lamas (violão de sete cordas) e Roberto Amaral (pandeiro), com a canção “Canto das três raças”, de Paulo César Pinheiro e Mauro Duarte.

Trabalho Escravo e Discriminação: Trajetória e Atualidade

Com esse tema o professor Ricardo Rezende Figueira, doutor no Programa de Pós-Graduação de Sociologia e Antropologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, abriu os trabalhos do primeiro painel do simpósio, sob a presidência do desembargador Lorival Ferreira dos Santos. O magistrado destacou a importância de se manter a luta pela conscientização da sociedade brasileira que, “nem mesmo com a ascensão de Pelé a atleta do século, conseguiu eliminar ou mesmo mitigar o preconceito racial”.

O acadêmico Ricardo Figueira, que também é pós-doutor pelo Instituto de Derechos Humanos “Bartolomé de las Casas”, da Universidad Carlos III, de Madri, traçou um panorama da história da escravidão no Brasil, desde a proibição do Papa Paulo III, em 1537, do uso de mão de obra escrava indígena nas Américas, até a Abolição da escravatura negra, em 1888. Nesses 350 anos, a visão da Igreja, aliada à necessidade econômica e até política, registrou avanços e retrocessos que marcaram a cultura brasileira que repetiu, com os imigrantes brancos europeus, em meados do século XIX, as mesmas práticas escravagistas até então praticadas. Legítima ou ilegítima, a prática da escravidão é, segundo o professor Figueira, um fenômeno antigo na humanidade, e no Brasil continua existindo nos dias de hoje, em suas práticas de exploração do trabalho análogo ao de escravo, lançando mão de modernos mecanismos de retenção, como a força física e armada, o isolamento geográfico e o endividamento econômico do trabalhador em razão do próprio trabalho.

Apesar das diferenças de contexto histórico (a escravidão legal não existe mais em nenhum país atualmente), o professor salientou que a prática da escravidão (ou de trabalho análogo ao de escravo) persiste nos dias atuais, e já se tornou um fenômeno em diversos países, ricos e pobres, facilitado, muitas vezes, pelo desemprego.

Mas o que é escravizar? Contrariamente ao que existe no imaginário popular e, também, no entendimento de alguns acadêmicos e até magistrados, a escravidão não se resume à retenção da liberdade, ao acorrentamento, mas se define como um tratamento específico com o propósito de desqualificar uma pessoa. A explicação é necessária, segundo o professor Ricardo Figueira, para se entender o fenômeno na modernidade. No Brasil, o Código Penal define o crime de trabalho escravo como “reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto”. A bancada ruralista, porém, segundo o professor, entende como um problema a atual redação do Código Penal, por não definir o que é “jornada exaustiva” e “condição degradante de trabalho”, e defende que o conceito de trabalho escravo se restringe àquele com retenção de liberdade.

É importante lembrar, segundo concluiu o palestrante, que a ideia de liberdade é recente na história da humanidade, e nasceu em fins do século XVIII, mas se restringia a “brancos com propriedade”. Nesse sentido, o conceito de liberdade ainda está em construção na sociedade e desafia a todos.




Fonte:
http://portal.trt15.jus.br/-/simposio-no-trt-15-aborda-a-persistencia-do-trabalho-escravo-na-atualidade